Reinado de terror do czar: Ivan, o Terrível - Parte 2





Como era a Rússia antes de Ivan, o Terrível?

Os primórdios da história da Rússia são informes e obscuros. Acredita-se que os antepassados dos atuais russos foram tribos eslavas que, por volta de 400 d.C., migraram de sudeste para leste, fixando-se em clareiras abertas nas florestas ao longo dos vales do Dnieper, do Don e de outros rios.
Por volta de 850, príncipes mercadores vikings chegaram à Rússia vindos da Escandinávia. Segundo a lenda, em 862, um príncipe de Jutlândia chamado Rurik fundou um Estado, estabelecendo a cidade de Novgorod como sua cidadela.
Em 988, ano que marca o início da história da Rússia, Vladimir, grande príncipe de Kiev, enviou emissários para estudarem as religiões judaicas, muçulmana, católica romana e grega ortodoxa. Desprezando a fé do Islã, porque proibia aos seus fiéis beberem álcool, mas deslumbrados com a suntuosidade da Igreja de Santa Sofia, em Constantinopla, os enviados recomendaram a fé ortodoxa - que Vladimir adotou e tem sido a religião russa desde então.
Em cinquenta anos, Kiev já tinha mais de duzentas igrejas e tornou-se a principal cidade de uma pouco rígida federação de estados. Durante o século XIII, nômades tártaros, governados por khans mongóis, reduziram a maior parte da Rússia a um estado de quase escravidão; só Novgorod manteve a independência.
Com o declínio do poder tártaro no século XV, a Rússia se recuperou e Moscou tornou-se a maior cidade do país. O arquiteto da sua ascensão à supremacia foi o grande príncipe Ivan, conhecido como Ivan, o Grande, que reinou em Moscou de 1462 a 1505. Em 1472, casou com a sobrinha do último imperador de Bizâncio, ligando assim a sua família às glórias da antiga Roma. Ivan reforçou a posição de Moscou recusando-se a prestar tributos aos khans, conquistando largas faixas de território à volta da cidade e anexando Novgorod.
Esta foi a herança que Ivan, o Grande, deixou ao seu filho Vasily, em 1505, e que passou para o seu neto Ivan, o Terrível.

Qual a atitude de Ivan para com a religião?

Conta-se que os primeiros anos da Rússia foram dominados por duas forças, a crueldade e o cristianismo, e esta dualidade esteve presente no mais alto grau no caráter de Ivan. Foi educado no conhecimento profundo das Escrituras e das vidas dos santos. Quando jovem, foi influenciado por um sacerdote chamado Silvestre, que fazia sermões sobre o fogo do inferno e a condenação eterna numa tentativa de limitar os excessos de Ivan - embora Silvestre mais tarde perdesse o favor real por utilizar a sua posição para nomear os seus candidatos para diversos cargos estatais importantes e influentes.





Símbolo de sucesso:
Ivan construiu a Catedral de São Basílio na Praça Vermelha, em Moscou, para comemorar as suas vitórias sobre os tártaros.






Homens como este instigaram em Ivan a crença de que ele tinha o direito divino de reinar, crença que ele partilhava com os outros monarcas do seu tempo. Um forte impulso religioso coexistia com a sua barbárie. Depois de mandar executar um príncipe ou um boiardo ou massacrar os habitantes de uma aldeia, costumava assegurar que imediatamente fossem ditas orações para a salvação das suas almas.
Este comportamento contraditório era típico do caráter de Ivan e da sua relação com a religião. Costumava levantar-se de madrugada para rezar durante duas a três horas. Mas com a mesma determinação mandava estrangular ou queimar vivos os membros do clero que protestassem contra o seu comportamento. No entanto, empenhou-se na canonização de santos russos pela Igreja Ortodoxa e esteve sempre rodeado por cerimoniais religiosos. No seu leito de morte, foi barbeado e abençoado como um monge, e quando o seu túmulo foi aberto no Kremlin, em 1963, viu-se que estava vestido não com a rica túnica e ornamentos de um czar, mas com o austero hábito de um monge.

Quem eram os boiardos?

No princípio da Idade Média, a Rússia era uma comunidade de príncipes permanentemente em guerra uns com os outros. As cidades de Kiev, Novgorod e Moscou eram governadas por grandes príncipes. A seguir a estes, vinham os boiardos, chefes feudais que deviam fidelidade ao grande príncipe e eram recompensados com concessões de terra em troca de serviços militares.
Quando Moscou adquiriu importância, nos séculos XIV e XV, e o seu grande príncipe se tornou, na prática, o líder da Rússia, aqueles chefes feudais acorreram ao novo centro de poder e formaram a Assembleia de Boiardos, que era consultada nas grandes questões políticas. Quando o grande príncipe era fraco, os boiardos assumiam o poder. Assim aconteceu durante a infância de Ivan, o Terrível. Mal chegou ao poder, aos 14 anos, Ivan castigou os boiardos rebeldes, executando-os ou exilando-os . Quando ele morreu, em 1584, eram uma força em extinção.
Coube ao czar Pedro, o Grande, completar a humilhação dos boiardos. Em 1698, de regresso a Moscou depois de uma viagem pela Europa, Pedro ordenou-lhes que cortassem as barbas e as grandes mangas das suas vestes, a fim de parecerem ocidentalizados. Mais tarde, aboliu por completo a classe dos boiardos.

Para onde Ivan expandiu as fronteiras da Rússia?

Durante o seu longo reinado, Ivan pôde impor a sua vontade à Rússia combinando uma política determinada e o terror premeditado. Mas, ao mesmo tempo, criou um Estado integrado que sobreviveu a um século de perturbações após a sua morte. Em 1545, iniciou uma campanha bem-sucedida contra os tártaros de Kazan, cujo império de fronteiras mal-definidas se estendia por centenas de quilômetros a leste de Moscou. Também conseguiu conquistar Astracã, expandindo as fronteiras da Rússia para sudeste, até o mar Cáspio; e no fim da sua vida, avançou para nordeste, rumo à Sibéria.
Igualmente importante era o acesso da Rússia ao Ocidente pelo Báltico. Impedido de estabelecer relações comerciais com a Europa Ocidental pela Livônia (atuais Letônia e Estônia), na costa do Báltico, e pelo reino católico e hostil da Polônia, Ivan tentou a princípio resolver a situação por meios pacíficos. Propôs casamento à irmã do rei da Polônia após a morte de Anastásia, em 1560, mas foi rejeitado. Ao mesmo tempo, empreendeu uma guerra longa e esgotante com a Livônia. Quando morreu, Ivan não havia conseguido ainda o acesso ao Ocidente através do Báltico.

Quais os laços da Rússia com a Europa Ocidental?

Em 1553, o navegador inglês Richard Chancellor tomou parte numa expedição para descobrir uma passagem a nordeste para Catai (China). Depois de dobrar o cabo Norte, na Noruega, foi impelido para o sul por uma tempestade e desembarcou na Rússia, acabando por se dirigir para a corte de Ivan, em Moscou.
Chancellor considerou Moscou "maior do que Londres, mas grosseira e sem qualquer ordem". Ivan estava sentado "numa cadeira dourado e com uma longa veste de folha de ouro". Depois de examinar a carta de Eduardo VI que incumbia Chancellor da sua missão, o czar deu-lhe importantes concessões comerciais, que levaram à fundação da Muscovy Company. No fim da vida, Ivan procurou reforçar as suas relações com a Inglaterra. Sugeriu à rainha Elisabeth o seu casamento com Lady Mary Hastings, prima da soberana inglesa, embora tivesse acabado de desposar a sua sétima mulher. Lady Mary implorou à rainha que não a obrigasse a tal união. Mas o destino interveio e Ivan morreu.