As descobertas de Galileu





Um simples telescópio caseiro apontado para o céu desafiou os ensinamentos da Igreja ao apresentar provas de que a Terra gira em torno do sol.

Em 7 de janeiro de 1610, o astrônomo Galileu Galilei direcionou o seu novo telescópio para uma mancha de luz que se movia devagar no firmamento noturno na cidade de Pádua, na Itália. O pequeno ponto que ele fixava era o planeta Júpiter. Para espanto de Galileu, o planeta era acompanhado por aquilo que ele pensou serem "quatro pequenas estrelas", o que na verdade eram satélites em torno de Júpiter.
A visão pôs em questão o conceito tradicional do Universo, apoiado pela Igreja, segundo o qual todos os corpos celestes giravam em torno da Terra. As descobertas de Galileu dariam origem a um violento confronto entre a Igreja e uma nova visão revolucionária do Universo.
As crenças ortodoxas sobre a natureza do Universo eram rígidas e há muito estabelecidas. Durante cerca de trezentos anos, a Igreja Católica e as universidades tinham aceito as teorias propostas pelos gregos da Antiguidade, em especial as ideias sobre o Universo de Aristóteles e Ptolomeu. Segundo eles, a Terra estava fixa no centro do universo e os corpos celestes moviam-se à sua volta. Como ninguém conseguia ver falhas na Lua, nos planetas e nas estrelas, estes eram considerados como modelos de perfeição, que se moviam em círculos, a mais perfeita das formas.

Galileo Galilei & Vincenzo Viviani, 1892
A igreja assumiu a teoria grega como suporte da sua missão "divina" - ajudar a humanidade a atingir a perfeição celestial. Para isso, eram fundamentais duas crenças. Primeiro, o céu devia ser sempre considerado perfeito. Segundo, a Terra na qual habitava a humanidade, devia ser o centro estável de todas as coisas, o foco da Criação de Deus. Assim, as teorias desenvolvidas por Aristóteles e Ptolomeu, defendendo este conceito, tornaram-se um dogma religioso.

Na época de Galileu, este dogma parecia enfraquecido. O sacerdote e matemático polaco Nicolau Copérnico tinha sugerido em 1543 que os movimentos planetários podiam ser mais facilmente explicados se o Sol fosse colocado no centro dos objetos. Em 1600, um pensador italiano, Giordano Bruno, foi queimado na fogueira pelas suas heresias, uma das quais era a sua insistência de que a Terra girava em torno do Sol. Galileu sabia a que se opunha, mas também sabia a força dos seus próprios conhecimentos.
Em 1582, com 18 anos, Galileu já havia começado com o trabalho que o levaria a formular várias leis básicas do movimento. Em 1609, quando ensinava Matemática em Pádua, ouviu falar de um fabricante de óculos holandês, Hans Lippershey, que havia montado duas lentes num tubo, construindo um telescópio primitivo. Galileu fez um para si próprio, que aumentava só três vezes o objeto focalizado. Levou-o a Veneza e vendeu a ideia ao doge (líder político veneziano) pelo seu potencial militar - pois com um telescópio os navios podiam ser identificados a distâncias maiores. Meses maisi tarde, Galileu fabricava um segundo telescópio, depois um terceiro, que aumentava 32 vezes.
Foi este terceiro telescópio que Galileu apontou para o céu em 1609-10. As descobertas sucederam-se rapidamente, e cada uma delas constituía um desafio ainda maior ao dogma religioso. Por exemplo, nada era perfeito na superfície da Lua, onde existiam crateras, montanhas e planícies. O Sol, até aí considerado "inviolado", tinha manchas na sua superfície, e Júpiter, as suas próprias luas, que decididamente não giravam em torno da Terra, Vênus tinha fases - da cheia à nova - que teriam sido impossíveis se, em vez de girar em torno do Sol, girasse em torno da Terra.
O telescópio de Galileu apresentou provas convincentes de que vivemos numa Terra que gira em torno do Sol, uma Terra que é um planeta, e não o centro da Criação. Copérnico tinha razão, e o dogma da Igreja estava errado, como o livro de Galileu de 1610, Siderius Nuncius (Mensageiro Estrelado), deixava claro.
Além disso, como provavam as obras que iam sendo publicadas em outras terras, os planetas nem sequer se moviam em círculos. Com base em observações pormenorizadas de um astrônomo alemão, Johannes Kepler (1571-1630), colega do astrônomo dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601), podia ver-se que os planetas não descreviam círculos perfeitos, mas antes elipses, ou ovais. Kepler enunciou três leis para explicar a velocidade e a órbita de um planeta, apoiando assim as teorias de Copérnico e de Galileu. Contudo, provar que a Terra se movia ainda não era fácil para Galileu. Havia problemas de observação que lançavam dúvidas sobre a sua obra. Alguns diziam que o telescópio de Galileu não merecia confiança. Então, em 1615, a Igreja aceitou o desafio.
"A novidade de tudo isto... pôs contra mim um tal número de professores... como se eu tivesse colocado estas coisas no céu com as minhas próprias mãos para perturbar a Natureza e atrapalhar a ciência!", Galileu Galilei (1615).
A teoria de Galileu, disse o papa, era "falsa e absurda, formalmente herética, e contrária às Escrituras". Galileu retirou-se da vida pública e só voltou em 1632 para defender Copérnico com o seu Diálogo sobre os Dois Principais Sistemas do Mundo. Como resultado, em 1633, Galileu foi intimado pela Inquisição, para "abjurar, maldizer e detestar" a sua opinião "herética" de que a Terra se movia. Ameaçado com a tortura, assim o fez, enquanto, diz-se, murmurava "E pur si muove" ("E no entanto ela se move"). Até sua morte, em 1642, esteve praticamente sob prisão domiciliar, mas o fato não impediu a divulgação das suas ideias. O dogma religioso tinha começado a recuar perante a ciência; mas foram precisos mais 359 anos para, em 1992, o papa João Paulo II ter reabilitado Galileu, atribuindo a sua prisão por heresia à "trágica incompreensão mútua".