A primeira mártir das sufragistas





A morte foi ao hipódromo quando as mulheres passaram das palavras aos atos na luta pelo direito do voto. 

Era dia de corridas, o Derby Day, em Epsom Downs, Inglaterra, em 4 de junho de 1913. A multidão juntou-se no Tattenham Corner para ver passar os cavalos no trecho final da grande prova do dia. Na assistência estava uma mulher jovem, perto da cerca pintada de branco. 
Quando os cavalos apareceram, a mulher passou por baixo da cerca, correu para o meio da pista e colocou-se à frente de Anmer, o cavalo do rei. O animal chocou-se contra ela, desviou e deu um salto mortal completo, derrubando o cavaleiro. 
A jovem, atingida pelos cascos do cavalo, ficou imóvel no chão, enquanto a multidão invadia a pista. Foi transportada de ambulância para o Hospital de Epsom Cottage, onde faleceu quatro dias depois devido a lesões na cabeça. Tratava-se de Emily Wilding Davison, de 32 anos, dedicada defensora do direito de voto feminino, presa muitas vezes por causa das suas reivindicações. Ninguém pôs em dúvida o motivo do ato praticado no Derby, pois no seu casaco foi encontrada a bandeira púrpura, verde e branca da União Social e Política de Mulheres (Women’s Social and Political Union, a WSPU), organização feminina militante cujos membros eram apelidados de suffragettes.
Organizou-se um cortejo fúnebre impressionante, com a presença de milhares de sufragistas de todo o país. As ruas do centro de Londres ficaram lotadas de gente. O último protesto de Emily Davison culminava anos de luta de organizações empenhadas no direito de voto das mulheres. 1897, Millicent Fawcett fundou uma organização chamada União Nacional de Sociedades para o Sufrágio das Mulheres (National Union of Women's Suffrage Societies, NUWSS), que se empenhava para que fosse concedido às mulheres o direito de voto. A NUWSS organizava manifestações pacíficas, marchas, debates, petições e a publicação de folhetos, livros e um jornal.
Frustradas pela falta de resultados, Emmeline Pankhurst e as filhas, Christabel e Sylvia, fundaram em 1903 a organização radical WSPU, que também defendia o direito de voto das mulheres. O seu lema "Atos, e não palavras", significava a rejeição dos métodos moderados da NUWSS em favor da militância.

O alvo principal da WSPU foi o Partido Liberal, que parecia determinado a vencer as eleições. Em 1905, Christabel Pankhurst e Annie Kenney, uma jovem operária, assistiram a uma sessão do partido no Free Trade Hall, em Manchester. No meio do auditório lotado, levantaram-se e perguntaram: "O Partido Liberal vai conceder o direito de voto às mulheres?", como não receberam respostas, insistiram em repetir a pergunta, e a sessão acabou em gritos e violência. As duas sufragistas foram detidas, acusadas de comportamento desordeiro e, mais tarde, encarceradas. No dia seguinte, os títulos dos principais jornais chamavam a atenção do povo britânico para a causa das sufragistas.
As atividades da WSPU, à medida que aumentava a resistência contra a causa, tornavam-se cada vez mais espetaculares. As sufragistas interrompiam reuniões políticas, assediavam deputados no Parlamento, cortavam cabos telefônicos e telegráficos e chegaram a invadir a Câmara dos Comuns. Várias centenas de mulheres, incluindo as Pankhurst, foram presas.



Imagem ao lado: "Alimentadas à força" - Sufragistas em greve de fome na prisão eram alimentadas por meio de um tubo introduzido no nariz. Em 1913, protestaram contra a chamada "Lei do gato e do rato", pela qual as mulheres que fizessem greve de fome eram libertadas por motivos de saúde e detidas de novo após a recuperação.




Os seus atos de desafio trouxeram-lhes apoios cada vez maiores - e também a hostilidade crescente dos seus oponentes. Em janeiro de 1908, as sufragistas de novo mereceram lugar nas primeiras páginas dos jornais por causa de uma manifestação na Downing Street, onde ia se realizar uma reunião do governo britânico.
Entre os jornalistas, fotógrafos e policiais estavam várias mulheres tentando chamar a atenção dos ministros para a reivindicação das sufragistas, enquanto a polícia afastava-as quando tentavam interrogar os membros do governo. Como os seus esforços pareciam em vão, duas sufragistas acorrentaram-se às grades do exterior da residência do primeiro-ministro, Sir Henry Campbell-Bannerman, falando sobre a necessidade de reformas políticas. Enquanto os policiais tentavam quebrar as correntes, parou um táxi do outro lado da rua, de onde saiu uma outra sufragista, que correu para a residência do primeiro-ministro e entrou, mas foi posta na rua antes de chegar à sala de reunião. A mulher foi detida com as suas correligionárias, acusadas de comportamento desordeiro, ficaram presas durante três semanas.
Nos anos seguintes, a campanha manteve o seu ímpeto. Em março de 1914, Mary Richardson entrou na National Gallery e com um machado danificou o quadro Vênus de Rokeby, de Velázquez, sendo detida e encarcerada. Em consequência de incidentes como este, muitos museus e galerias de arte fecharam suas portas.
Quando eclodiu a Primeira Guerra Mundial, em agosto desse ano, as sufragistas dirigiram as suas energias para o apoio no combate contra os alemães. Mas a batalha das mulheres não ficou esquecida, no fim das hostilidades, foi-lhes garantida uma primeira parcela daquilo por que haviam lutado com tanta valentia.

• Veja também: Campanha mundial pelo voto feminino